Dirigente reconta sua trajetória à frente da FNF e entra em rota de colisão com o poder público por falta de apoio ao futebol do RN
A garagem do número 2017 da Rua Marcílio Furtado é uma área aberta que permite ao passante ver o que está abrigado nela. Qualquer transeunte não daria a menor importância para qual veículo foi jogado sob o sol causticante de uma manhã de janeiro, não fosse o fato de haver uma ambulância acomodada nesse espaço da casa, que não é um hospital. Encarado mais de perto, observa-se no carro de socorro um brasão em vermelho e verde, sobre os quais se sobressai o branco da sigla FNF (Federação Norte-riograndense de Futebol). “Estaria também o futebol potiguar na UTI?”, pensei antes de entrar.
Ao comprar o veículo, o atual presidente da federação, José Vanildo, foi considerado um senil, conforme seu próprio relato. “O presidente da comissão nacional de antidoping veio aqui e me chamou de louco. Em outros cantos não tem. Vou comprar um ônibus e agora dizem que eu endoidei de vez”. Há cinco anos à frente da FNF, o cartola implementou mudanças de modernização e demitiu “vinte e tantos funcionários”.
“A federação historicamente era tratada de forma paternalista e de pouco investimento em recursos humanos, administrativo. Isso não era novo porque acompanhava a inércia dos filiados. A federação atual procurou se modernizar, oferecer estrutura de capacitação”, enumerou o presidente. Das glórias que relatou, contudo, a maior é o investimento em marketing, sobre o qual José Vanildo fala com o mesmo entusiasmo de uma criança que acabou de ganhar um brinquedo e ainda não sabe direito como mexer. “É pra isso que eu tenho Alan”, disse em referência ao jornalista e diretor da agência de marketing esportivo 10 Sports, Alan Oliveira.
Se por um lado ele não sabe exatamente como funciona, por outro procura meios para fazê-lo porque sabe que há retorno. Ao longo da conversa de quase uma hora e meia, encadeou sob seu bigode as palavras “marketing”, “produto” e “divulgação” vinte e uma vezes. “O marketing é o segredo. É por isso que eu elogio meu bigode. Você tem que conjugar o verbo marquetear em todos os tempos”, explanou antes de uma pausa dramática, depois da qual completou gaiatamente: “Eu tô foda hoje! Tô um típico heterossexual ativo”.
Falta combinar com mais empresários, no entanto, que o futebol potiguar é um produto no qual vale a pena investir. Até lá, a cartela de parceiros permanece com 10 nomes: Pitú, Fetronor, 10sports, Fecomércio, Salesiano, Garra, Esporte Interativo, Ster Bom, Penalti e Sparta. O nome de maior peso, a Chevrolet, largou o apoio ao futebol potiguar e de outros estados. Quem ficou, teve o anonimato fiscal garantido por José Vanildo, que não quis comentar quem paga quanto para ter sua marca exibida nos estádios. “Não tenho ideia de quanto é movimentado”.
Atualmente, uma placa de publicidade custa a um cliente R$ 30 mil. Se quiser duas nos estádios, há um pacote por R$ 45 mil. Se mais lhe convier, o pacote é definido pela periodicidade de exibição e quantidade de anúncios. Se todos os 10 nomes da atual cartela pagarem o valor mínimo, há uma receita com publicidade na ordem de R$ 300 mil, mesmo valor que a federação desembolsou na quinta-feira (29) para pagar a arbitragem pelas 84 partidas do estadual deste ano.
“Os empresários inteligentes investem no futebol. O futebol é bancado por empresário. E 99% não são daqui. E sabe por que eles são de fora? Porque eles são burros. Porque eles são ignorantes. A Pitú quando investe aqui é porque futebol não tem futuro. A Chevrolet quando investe aqui é porque o futebol é uma porcaria, sim porque ele está jogando dinheiro fora. O Salesiano quando investe é porque o futebol aqui não é sério. Claro que não é isso. É porque eles sabem o valor que o futebol tem para divulgação com a marca deles”, protesta o dirigente ironicamente. Zé Vanildo, como também é conhecido, atribui ao “ranço cultural contra o futebol” a resistência, sobretudo dos empresários locais, em investir “no meu produto futebol”. Algo menos subjetivo pode ajudar a entender o distanciamento.
A transmissão do futebol na maior emissora do país cai anualmente. Para transmitir os jogos da primeira divisão, elite do futebol que não tem um time do Rio Grande do Norte, a Globo tem patinado nos 15 pontos de audiência em pleno domingo, muito distante da glória atingida na década de 1990, quando uma final chegava a marcar mais de 50 pontos na audiência. E não estamos considerando que os times associados à FNF jogam, via de regra, com transmissão de emissoras fechadas, com audiência não conhecida pelo público. Para completar, na semana que passou, um estudo da consultoria Pluri apontou a edição 2015 do campeonato potiguar com seu pior valor de mercado dos últimos quatro anos.
Guru
O jornalista Alan Oliveira mal tinha saída do marketing do ABC, em 2011, quando Zé Vanildo o convidou para assumir os trabalhos de mídia à frente da federação. O convite tinha razão de ser: havia pressão dos dirigentes dos clubes para que a imagem do futebol potiguar fosse vendida de maneira proveitosa e sob a batuta de Alan e da 10 Sports, houve uma campanha que deixou o ABC com 10 mil associados em seis meses. De pronto, o jornalista aceitou o convite.
No campeonato do ano seguinte, o fiasco publicitário parecia iminente. Apenas um cliente havia comprado uma placa nos estádios para a divulgação. O preço na época era R$ 20 mil por placa posta no estádio e a empresa tinha a marca exibida durante todo o estadual. Depois de três meses de trabalho, o estadual de 2012 foi aberto com 12 clientes, com uma receita mínima de R$ 240 mil.
Foi daí em diante que o marketing se tornou a obsessão do presidente da FNF. As ações cujos resultados terminassem em mídia espontânea para o futebol logo eram prontamente acolhidas. Foi na esteira desse pensamento que se desenvolveram a escolha da mascote e da musa da competição, que atrai a macharada toda para votar e mobiliza um sem fim de contas no Facebook e Whatsapp.
Afinado com o discurso do presidente, o marketing da federação quer atrair o empresariado local. Com um olho nas receitas publicitárias e outro nos estádios cheios, pretende apresentar um projeto que credencia a revenda de ingressos para o estadual, ficando a critério do empresário fixar o preço que desejar. Pela proposta de Alan, 10% de todos os ingressos serão destinados a esse projeto. “Zé na verdade é um grande amigo. Ele me dá apoio para tudo”, comentou Alan Oliveira, rejeitando a pecha de guru do presidente guiado pelo marketing.
Governo
Dos atores que encenam contra o futebol, na visão de Zé Vanildo, nenhum é tão bom como o poder público, contra quem ele não mede críticas. “Eu nunca recebi uma dedada, uma cutucada de governo. O governo aqui historicamente exclui com o argumento pífio, argumento bufa, com a história de que – faz voz de criancinha – futebol é profissional. É profissional e tem que ser mesmo. Onde o governo coloca a mão para gerir quebra”.
Para ele é vergonhoso que o gestor público não invista na área. “Você já pensou se o governo investisse em futebol? Era um escândalo. A CBF é o maior escândalo do Brasil – reclinei-me na cadeira achando que ele iria falar sobre os desmandos na confederação, mas a linha de pensamento foi outra – porque mexe com a emoção do torcedor. Na hora em que a mão do governo tocasse ali, criava um ministério com num sei quantos cargos. Aí não ia funcionar. Funciona hoje porque funciona como uma coisa privada. Esse argumento de que futebol é feio é de quem tá do outro lado da cadeira”.
Remonta ao governo de José Agripino o último gesto que o Estado teve pelo futebol potiguar, na lembrança de Zé Vanildo. Fiquei inclinado a questionar se a Arena das Dunas não era uma contribuição, mas ele levou a conversa para Pernambuco: “Lá, 75% de quem vai o estádio é pelo Todos com a Nota. Há uma campanha tributária e o torcedor entra de cara nesse projeto que acaba definitivamente com a história de dar dinheiro ao futebol”.
Perguntei por que diabos o governo deveria investir em algo que é essencialmente privado. O presidente da FNF me fitou perplexo, como se eu tivesse, sei lá, acabado de cuspir na imagem de Nossa Senhora. “Da mesma forma que ele investe nos hotéis. Os hotéis são investimento essencialmente privado. Sabe quando o governo investe lá fora? Qual o maior evento do Brasil? Futebol! Do Rio Grande do Norte? Futebol! É o futebol e isso gera emprego e renda. Até pouco tempo ninguém sabia quem era Goianinha, hoje é nome nacional. Até pouco tempo ninguém sabia quem era Ceará-Mirim, e hoje é referenciado no Brasil porque tem um estádio que gera divulgação nacional com o Globo”, esbravejou o dirigente. Agora quem estava perplexo era eu. Levamos o assunto para alguns meses atrás.
Uma constatação do trade turístico é que a propalada divulgação de Natal com a Copa do Mundo de Futebol não gerou o retorno prometido para o turismo com o material midiático. Diante da afirmação de que Ceará-Mirim foi catapultada do nada para a glória nacional por causa do Globo, confrontei o presidente com o caso concreto de Natal. O que se disse sobre o trade turístico é impublicável.
“Esse argumento de ficar ao lado dos poderosos hoteleiros é muito mais fácil do que ficar ao lado do time pequeno, do time do interior”, diz o presidente da FNF. Em que pese o discurso carregado contra o poder público, ele não nega que gostaria ter a parceria. Certa vez, na esteira do sucesso do projeto Futebol em Tom Maior, ele procurou a Fundação José Augusto para pedir apoio à iniciativa. “E sabe o que me disseram? Que futebol não se enquadra em cultura. Vou começar a dar o c* vê se se enquadra em cultura”.
Histórico
Aos 62 anos (para revelar a idade ele me perguntou se eu não era um heterossexual ativo), José Vanildo da Silva fez carreira no direito antes de chegar ao futebol. Advogado e procurador da Câmara Municipal de Natal teve a presidência da FNF gestada no encontro entre futebol e legislação, na década passada.
Então conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil, ele foi indicado pela OAB para ser o representante da instituição no Tribunal de Justiça Desportiva, estrutura criada pela Confederação Brasileira de Futebol à semelhança do Judiciário comum. Uma vez instalado como membro, Zé Vanildo mirou a presidência e a alcançou.
Em 2005, uma intervenção destituiu Nilson Gomes da presidência da FNF, foi quando o jornalista Alexandre Cavalcanti, então deputado estadual, disputou o cargo, com Zé Vanildo como vice-presidente. Dois anos depois, Cavalcanti se afastou da federação por motivos de saúde, e Zé Vanildo reina com orbe, coroa e cetro desde então. Para esta reportagem, não foi localizada uma viva alma que pudesse ser contraponto à Zé Vanildo. É um presidente sem oposição.
“No começo da administração, eu achava que não ia dar certo porque ele era muito… Eu não gostava. Mas agora ele reconhece mais as dificuldades dos clubes do interior. Depois ele viu melhor o que era administrar uma federação e viu os direitos que os clubes tinham. Acho que ele deve ir por aí do jeito que ele tá”, comentou o único potencial insurgente contra Zé Vanildo, Lobão Filho, dirigente do Corithians de Caicó. Recentemente, ele se valeu da ajuda da federação para inscrever o time no campeonato.
Pai de cinco filhos e avô de três netos, a figura do presidente é conhecida por ser extrovertido. Dê-lhe um palco, ele faz seu show. À reportagem, deixou baixar o espírito de Tim Maia e fez uma performance fiel do cantor, com direito a trejeitos e tudo mais. Quando cantou o último acordo de “Me dê motivo”, contorceu-se na cadeira e passou a imitar o deputado Agnelo Alves.
Fiquei chocado com a fidelidade da encenação, tivesse fechado os olhos e deixado apenas os ouvidos atentos, poderia jurar que se tratava do pai do prefeito Carlos Eduardo. “Por isso, certa vez, assumi a bancada do programa na Rádio Globo. Agnelo ficou chocado enquanto eu me passava no rádio por ele”, rememorou.
O triunfo de Zé Vanildo na federação, abriu caminhos na cúpula nacional do futebol. O dirigente também se credenciou a um posto na CBF. Atualmente, ele integra a comissão de compras. A única reclamação que faz sobre a Confederação é que acha que deveria ser mais justa a divisão de receitas gerada no campeonato. Se para ele essa é a única objeção à CBF, para o público em geral não. O farto noticiário sobre corrupção na cúpula da cartolagem não passou sem comentários para Vanildo, que preferiu trazer o assunto para a realidade local.
“Eu tenho a convicção de que a média do entendimento do torcedor potiguar favorece a federação daqui. Ele acredita na federação, tanto é que estou estudando pedir uma pesquisa para avaliar isso e vê a questão de como o torcedor enxerga essas questões”, revelou Zé Vanildo.
Boca miúda
Recentemente, a CBF passou a pagar R$ 15 mil aos presidentes das federações estaduais mensalmente. Em tempo: são tais presidentes que elegem o dirigente da confederação. Zé Vanildo acha um acinte tratar o tema dessa perspectiva.
“Eu tenho cargo na CBF, não recebo nenhum centavo da federação de futebol. Sou procurador, advogado, tenho escritório e minha vida. Não posso avaliar os outros”, iniciou em tom de protesto. Mas o senhor tem uma opinião sobre essa mesada, insisti. “Meu projeto não é esse. Meu projeto é brigar pelo marketing, pela Chevrolet, buscar patrocínios nacionais. Um dirigente ganha muito bem da CBF. Esse valor atribuído aos presidentes estaduais são ridículos”.
A mesada contestada não foi o único assunto delicado. Em meio a uma entrevista pontuada pelos termos de marketing e mídia, não deixei de dar voz aos questionamentos corriqueiros que repórteres de esportes fazem à boca miúda: O senhor não paga a nenhum jornalista para falar bem da federação? O telefone tocou.
“Alan Kardec [Alan Oliveira]! Estou dando uma entrevista aqui, falando da maior empresa de marketing do Brasil, a… como é seu nome? Dinarte, decididamente heterossexual ativo. Tá aqui me fazendo um bocado de pergunta com emboscada, mas eu tô botando pra f…, do jeito que você me ensinou. Sim… É aquele assunto que eu tive. Esse assunto quem resolve sou eu e você, o dele a gente resolve como queremos. Captou? É, é, é verdade. Dinarte está mandando um abraço” – Não mandei abraço nenhum – “Onde paramos?” Na mesada a jornalistas. Ele negou peremptoriamente, e emendou com uma história.
“Fui dar uma entrevista, fui fazer uma conferência, porra, eu sou foda, sou tampa de furico, na Paraíba. E lá acham interessante meu jeito de administrar. Aí na Paraíba, me disseram assim: ‘presidente, aqui, dizem que a presidente afastada dava dinheiro para jornalistas. E você?’. Respondi que isso é uma pergunta que eu devia mandar você tomar no c…! Mas tomar no c… no futebol é simbolismo. Isso não é agressão”, levando meu heterossexualismo ativo aos risos.
Fonte/Dinarte Assunção
Ao comprar o veículo, o atual presidente da federação, José Vanildo, foi considerado um senil, conforme seu próprio relato. “O presidente da comissão nacional de antidoping veio aqui e me chamou de louco. Em outros cantos não tem. Vou comprar um ônibus e agora dizem que eu endoidei de vez”. Há cinco anos à frente da FNF, o cartola implementou mudanças de modernização e demitiu “vinte e tantos funcionários”.
“A federação historicamente era tratada de forma paternalista e de pouco investimento em recursos humanos, administrativo. Isso não era novo porque acompanhava a inércia dos filiados. A federação atual procurou se modernizar, oferecer estrutura de capacitação”, enumerou o presidente. Das glórias que relatou, contudo, a maior é o investimento em marketing, sobre o qual José Vanildo fala com o mesmo entusiasmo de uma criança que acabou de ganhar um brinquedo e ainda não sabe direito como mexer. “É pra isso que eu tenho Alan”, disse em referência ao jornalista e diretor da agência de marketing esportivo 10 Sports, Alan Oliveira.
Se por um lado ele não sabe exatamente como funciona, por outro procura meios para fazê-lo porque sabe que há retorno. Ao longo da conversa de quase uma hora e meia, encadeou sob seu bigode as palavras “marketing”, “produto” e “divulgação” vinte e uma vezes. “O marketing é o segredo. É por isso que eu elogio meu bigode. Você tem que conjugar o verbo marquetear em todos os tempos”, explanou antes de uma pausa dramática, depois da qual completou gaiatamente: “Eu tô foda hoje! Tô um típico heterossexual ativo”.
Falta combinar com mais empresários, no entanto, que o futebol potiguar é um produto no qual vale a pena investir. Até lá, a cartela de parceiros permanece com 10 nomes: Pitú, Fetronor, 10sports, Fecomércio, Salesiano, Garra, Esporte Interativo, Ster Bom, Penalti e Sparta. O nome de maior peso, a Chevrolet, largou o apoio ao futebol potiguar e de outros estados. Quem ficou, teve o anonimato fiscal garantido por José Vanildo, que não quis comentar quem paga quanto para ter sua marca exibida nos estádios. “Não tenho ideia de quanto é movimentado”.
Atualmente, uma placa de publicidade custa a um cliente R$ 30 mil. Se quiser duas nos estádios, há um pacote por R$ 45 mil. Se mais lhe convier, o pacote é definido pela periodicidade de exibição e quantidade de anúncios. Se todos os 10 nomes da atual cartela pagarem o valor mínimo, há uma receita com publicidade na ordem de R$ 300 mil, mesmo valor que a federação desembolsou na quinta-feira (29) para pagar a arbitragem pelas 84 partidas do estadual deste ano.
“Os empresários inteligentes investem no futebol. O futebol é bancado por empresário. E 99% não são daqui. E sabe por que eles são de fora? Porque eles são burros. Porque eles são ignorantes. A Pitú quando investe aqui é porque futebol não tem futuro. A Chevrolet quando investe aqui é porque o futebol é uma porcaria, sim porque ele está jogando dinheiro fora. O Salesiano quando investe é porque o futebol aqui não é sério. Claro que não é isso. É porque eles sabem o valor que o futebol tem para divulgação com a marca deles”, protesta o dirigente ironicamente. Zé Vanildo, como também é conhecido, atribui ao “ranço cultural contra o futebol” a resistência, sobretudo dos empresários locais, em investir “no meu produto futebol”. Algo menos subjetivo pode ajudar a entender o distanciamento.
A transmissão do futebol na maior emissora do país cai anualmente. Para transmitir os jogos da primeira divisão, elite do futebol que não tem um time do Rio Grande do Norte, a Globo tem patinado nos 15 pontos de audiência em pleno domingo, muito distante da glória atingida na década de 1990, quando uma final chegava a marcar mais de 50 pontos na audiência. E não estamos considerando que os times associados à FNF jogam, via de regra, com transmissão de emissoras fechadas, com audiência não conhecida pelo público. Para completar, na semana que passou, um estudo da consultoria Pluri apontou a edição 2015 do campeonato potiguar com seu pior valor de mercado dos últimos quatro anos.
Guru
O jornalista Alan Oliveira mal tinha saída do marketing do ABC, em 2011, quando Zé Vanildo o convidou para assumir os trabalhos de mídia à frente da federação. O convite tinha razão de ser: havia pressão dos dirigentes dos clubes para que a imagem do futebol potiguar fosse vendida de maneira proveitosa e sob a batuta de Alan e da 10 Sports, houve uma campanha que deixou o ABC com 10 mil associados em seis meses. De pronto, o jornalista aceitou o convite.
No campeonato do ano seguinte, o fiasco publicitário parecia iminente. Apenas um cliente havia comprado uma placa nos estádios para a divulgação. O preço na época era R$ 20 mil por placa posta no estádio e a empresa tinha a marca exibida durante todo o estadual. Depois de três meses de trabalho, o estadual de 2012 foi aberto com 12 clientes, com uma receita mínima de R$ 240 mil.
Foi daí em diante que o marketing se tornou a obsessão do presidente da FNF. As ações cujos resultados terminassem em mídia espontânea para o futebol logo eram prontamente acolhidas. Foi na esteira desse pensamento que se desenvolveram a escolha da mascote e da musa da competição, que atrai a macharada toda para votar e mobiliza um sem fim de contas no Facebook e Whatsapp.
Afinado com o discurso do presidente, o marketing da federação quer atrair o empresariado local. Com um olho nas receitas publicitárias e outro nos estádios cheios, pretende apresentar um projeto que credencia a revenda de ingressos para o estadual, ficando a critério do empresário fixar o preço que desejar. Pela proposta de Alan, 10% de todos os ingressos serão destinados a esse projeto. “Zé na verdade é um grande amigo. Ele me dá apoio para tudo”, comentou Alan Oliveira, rejeitando a pecha de guru do presidente guiado pelo marketing.
Governo
Dos atores que encenam contra o futebol, na visão de Zé Vanildo, nenhum é tão bom como o poder público, contra quem ele não mede críticas. “Eu nunca recebi uma dedada, uma cutucada de governo. O governo aqui historicamente exclui com o argumento pífio, argumento bufa, com a história de que – faz voz de criancinha – futebol é profissional. É profissional e tem que ser mesmo. Onde o governo coloca a mão para gerir quebra”.
Para ele é vergonhoso que o gestor público não invista na área. “Você já pensou se o governo investisse em futebol? Era um escândalo. A CBF é o maior escândalo do Brasil – reclinei-me na cadeira achando que ele iria falar sobre os desmandos na confederação, mas a linha de pensamento foi outra – porque mexe com a emoção do torcedor. Na hora em que a mão do governo tocasse ali, criava um ministério com num sei quantos cargos. Aí não ia funcionar. Funciona hoje porque funciona como uma coisa privada. Esse argumento de que futebol é feio é de quem tá do outro lado da cadeira”.
Remonta ao governo de José Agripino o último gesto que o Estado teve pelo futebol potiguar, na lembrança de Zé Vanildo. Fiquei inclinado a questionar se a Arena das Dunas não era uma contribuição, mas ele levou a conversa para Pernambuco: “Lá, 75% de quem vai o estádio é pelo Todos com a Nota. Há uma campanha tributária e o torcedor entra de cara nesse projeto que acaba definitivamente com a história de dar dinheiro ao futebol”.
Perguntei por que diabos o governo deveria investir em algo que é essencialmente privado. O presidente da FNF me fitou perplexo, como se eu tivesse, sei lá, acabado de cuspir na imagem de Nossa Senhora. “Da mesma forma que ele investe nos hotéis. Os hotéis são investimento essencialmente privado. Sabe quando o governo investe lá fora? Qual o maior evento do Brasil? Futebol! Do Rio Grande do Norte? Futebol! É o futebol e isso gera emprego e renda. Até pouco tempo ninguém sabia quem era Goianinha, hoje é nome nacional. Até pouco tempo ninguém sabia quem era Ceará-Mirim, e hoje é referenciado no Brasil porque tem um estádio que gera divulgação nacional com o Globo”, esbravejou o dirigente. Agora quem estava perplexo era eu. Levamos o assunto para alguns meses atrás.
Uma constatação do trade turístico é que a propalada divulgação de Natal com a Copa do Mundo de Futebol não gerou o retorno prometido para o turismo com o material midiático. Diante da afirmação de que Ceará-Mirim foi catapultada do nada para a glória nacional por causa do Globo, confrontei o presidente com o caso concreto de Natal. O que se disse sobre o trade turístico é impublicável.
“Esse argumento de ficar ao lado dos poderosos hoteleiros é muito mais fácil do que ficar ao lado do time pequeno, do time do interior”, diz o presidente da FNF. Em que pese o discurso carregado contra o poder público, ele não nega que gostaria ter a parceria. Certa vez, na esteira do sucesso do projeto Futebol em Tom Maior, ele procurou a Fundação José Augusto para pedir apoio à iniciativa. “E sabe o que me disseram? Que futebol não se enquadra em cultura. Vou começar a dar o c* vê se se enquadra em cultura”.
Histórico
Aos 62 anos (para revelar a idade ele me perguntou se eu não era um heterossexual ativo), José Vanildo da Silva fez carreira no direito antes de chegar ao futebol. Advogado e procurador da Câmara Municipal de Natal teve a presidência da FNF gestada no encontro entre futebol e legislação, na década passada.
Então conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil, ele foi indicado pela OAB para ser o representante da instituição no Tribunal de Justiça Desportiva, estrutura criada pela Confederação Brasileira de Futebol à semelhança do Judiciário comum. Uma vez instalado como membro, Zé Vanildo mirou a presidência e a alcançou.
Em 2005, uma intervenção destituiu Nilson Gomes da presidência da FNF, foi quando o jornalista Alexandre Cavalcanti, então deputado estadual, disputou o cargo, com Zé Vanildo como vice-presidente. Dois anos depois, Cavalcanti se afastou da federação por motivos de saúde, e Zé Vanildo reina com orbe, coroa e cetro desde então. Para esta reportagem, não foi localizada uma viva alma que pudesse ser contraponto à Zé Vanildo. É um presidente sem oposição.
“No começo da administração, eu achava que não ia dar certo porque ele era muito… Eu não gostava. Mas agora ele reconhece mais as dificuldades dos clubes do interior. Depois ele viu melhor o que era administrar uma federação e viu os direitos que os clubes tinham. Acho que ele deve ir por aí do jeito que ele tá”, comentou o único potencial insurgente contra Zé Vanildo, Lobão Filho, dirigente do Corithians de Caicó. Recentemente, ele se valeu da ajuda da federação para inscrever o time no campeonato.
Pai de cinco filhos e avô de três netos, a figura do presidente é conhecida por ser extrovertido. Dê-lhe um palco, ele faz seu show. À reportagem, deixou baixar o espírito de Tim Maia e fez uma performance fiel do cantor, com direito a trejeitos e tudo mais. Quando cantou o último acordo de “Me dê motivo”, contorceu-se na cadeira e passou a imitar o deputado Agnelo Alves.
Fiquei chocado com a fidelidade da encenação, tivesse fechado os olhos e deixado apenas os ouvidos atentos, poderia jurar que se tratava do pai do prefeito Carlos Eduardo. “Por isso, certa vez, assumi a bancada do programa na Rádio Globo. Agnelo ficou chocado enquanto eu me passava no rádio por ele”, rememorou.
O triunfo de Zé Vanildo na federação, abriu caminhos na cúpula nacional do futebol. O dirigente também se credenciou a um posto na CBF. Atualmente, ele integra a comissão de compras. A única reclamação que faz sobre a Confederação é que acha que deveria ser mais justa a divisão de receitas gerada no campeonato. Se para ele essa é a única objeção à CBF, para o público em geral não. O farto noticiário sobre corrupção na cúpula da cartolagem não passou sem comentários para Vanildo, que preferiu trazer o assunto para a realidade local.
“Eu tenho a convicção de que a média do entendimento do torcedor potiguar favorece a federação daqui. Ele acredita na federação, tanto é que estou estudando pedir uma pesquisa para avaliar isso e vê a questão de como o torcedor enxerga essas questões”, revelou Zé Vanildo.
Boca miúda
Recentemente, a CBF passou a pagar R$ 15 mil aos presidentes das federações estaduais mensalmente. Em tempo: são tais presidentes que elegem o dirigente da confederação. Zé Vanildo acha um acinte tratar o tema dessa perspectiva.
“Eu tenho cargo na CBF, não recebo nenhum centavo da federação de futebol. Sou procurador, advogado, tenho escritório e minha vida. Não posso avaliar os outros”, iniciou em tom de protesto. Mas o senhor tem uma opinião sobre essa mesada, insisti. “Meu projeto não é esse. Meu projeto é brigar pelo marketing, pela Chevrolet, buscar patrocínios nacionais. Um dirigente ganha muito bem da CBF. Esse valor atribuído aos presidentes estaduais são ridículos”.
A mesada contestada não foi o único assunto delicado. Em meio a uma entrevista pontuada pelos termos de marketing e mídia, não deixei de dar voz aos questionamentos corriqueiros que repórteres de esportes fazem à boca miúda: O senhor não paga a nenhum jornalista para falar bem da federação? O telefone tocou.
“Alan Kardec [Alan Oliveira]! Estou dando uma entrevista aqui, falando da maior empresa de marketing do Brasil, a… como é seu nome? Dinarte, decididamente heterossexual ativo. Tá aqui me fazendo um bocado de pergunta com emboscada, mas eu tô botando pra f…, do jeito que você me ensinou. Sim… É aquele assunto que eu tive. Esse assunto quem resolve sou eu e você, o dele a gente resolve como queremos. Captou? É, é, é verdade. Dinarte está mandando um abraço” – Não mandei abraço nenhum – “Onde paramos?” Na mesada a jornalistas. Ele negou peremptoriamente, e emendou com uma história.
“Fui dar uma entrevista, fui fazer uma conferência, porra, eu sou foda, sou tampa de furico, na Paraíba. E lá acham interessante meu jeito de administrar. Aí na Paraíba, me disseram assim: ‘presidente, aqui, dizem que a presidente afastada dava dinheiro para jornalistas. E você?’. Respondi que isso é uma pergunta que eu devia mandar você tomar no c…! Mas tomar no c… no futebol é simbolismo. Isso não é agressão”, levando meu heterossexualismo ativo aos risos.
Fonte/Dinarte Assunção
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