Paulo Henrique e Denis, Itapirense (Foto: Leonardo Lourenço)Com apenas oito minutos de jogo, o lateral-esquerdo Paulo Henrique, de 28 anos, pisou de mau jeito no gramado e sofreu lesão no joelho esquerdo. Era a estreia da Itapirense na Série A-3 do Paulista, em duelo contra o São José, em São José dos Campos. O campeonato acabava cedo para o atleta, mas seus problemas estavam apenas começando.
A equipe de Itapira, na região de Campinas, encerrou sua participação na terceira divisão estadual no dia 19 de abril, na 14ª posição e escapando por pouco do rebaixamento. Quatro meses após sua contusão, Paulo Henrique ainda não fez a cirurgia para reconstruir o ligamento cruzado do joelho. O clube também não pagou mais seus salários desde março – o contrato terminou no sábado, 30 de maio.
A situação levou o jogador a liderar um motim: ele convenceu 22 dos 28 jogadores inscritos pela Itapirense a processarem o clube – 16 ações foram protocolados no fórum trabalhista da cidade, enquanto outros seis atletas já entregaram procurações aos advogados Thiago e Filipe Rino, que coordenam as ações. A expectativa é de que esse número aumente nos próximos dias.
– Estou fazendo o tratamento por conta própria, o clube não me deu apoio. Estou correndo atrás pelo SUS (Sistema Único de Saúde), pois é tudo o que posso fazer. Não tenho R$ 15 mil para a cirurgia – afirma Paulo Henrique.
Para a disputa da A-3, os jogadores da Itapirense acertaram contratos curtos com valores que variavam de R$ 2 mil a R$ 3,5 mil. O acordo dividia o pagamento em R$ 1 mil em carteira – registro que, segundo os atletas, nunca foi feito – e o restante em direitos de imagem – mas eles reclamam que suas vias dos contratos jamais foram entregues pela diretoria. Os pagamentos eram entregues em dinheiro na casa utilizada como alojamento. Os jogadores assinavam uma lista ao receberem.
– Só foi possível comprovar que eles são atletas do clube porque a FPF (Federação Paulista de Futebol) mantém arquivos com esses contratos, e pelas as súmulas das partidas que eles disputaram – diz o advogado Thiago Rino.
Assim como Paulo Henrique, o também lateral-esquerdo Dênis, 26, sofreu uma lesão no joelho durante o torneio. E assim como o colega, ainda aguarda a cirurgia. Por isso, além da cobrança dos atrasados, ambos pedem indenizações por acidentes de trabalho.
– O clube tem responsabilidade. Eu me machuquei e tenho que sair bem daqui, como cheguei. Eles não me deram assistência – reclama o jogador.
– A sensação é ruim demais. Tenho contas, elas vencem, a gente tem de pagar juros. Depois que eu me lesionei, não tinha o que fazer. Era rezar pra sair alguma coisa para acertar minhas dívidas. Os meninos ainda treinavam, tinham algo para esquecer o problema. Para mim era só fisioterapia e o pensamento no dinheiro – completa Dênis.
As ações incluem não só a Itapirense como réu, mas também seu presidente, o empresário Luiz Marcos de Paula. Os advogados repetem a estratégia que utilizaram contra o mandatário do Barueri, Alberto Ferrari, e tentam reter bens pessoais do cartola. Neste ano, em decisão inédita, a Justiça do Trabalho bloqueou um veículo de Ferrari para garantir o pagamento de dívidas com jogadores que, no ano passado, realizaram greve durante a Série D.
– Ele é o responsável pela contratação, pelo pagamento dos salários, e a Lei Pelé dá a possibilidade da inclusão do dirigente como corresponsável pelas dívidas – explica Thiago.
O episódio na Itapirense ilustra a situação dos pequenos clubes do país. Segundo o Bom Senso FC, das 684 equipes brasileiras, 583 não têm calendário anual – a estimativa é de que mais de 10 mil jogadores fiquem sem emprego após os estaduais.
Thiago e Filipe Rino, cujo escritório tem parceria com o sindicato dos atletas paulistas, contam ter distribuído 360 ações dos tipo nos últimos dois anos.
– É um número que nos surpreendeu, não tínhamos noção disso. Nos impressiona. São 360 atletas que deixaram de receber seus salários e de prover o sustento de suas famílias – afirma Filipe, que cita processos em massa também contra o União Barbarense, de Santa Barbára d’Oeste, e Tupã, da cidade de mesmo nome.
A reportagem conversou com o diretor da Itapirense, Sandro Candreva, no último dia 28 de maio. Ele não quis dar entrevista e se limitou a dizer que o jogadores poderiam "procurar seus direitos". O dirigente não atendeu às outras ligações.
Fonte/Globo Esporte
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